Apresentação

Ainda que possam parecer termos equivalentes, existe uma enorme diferença entre aprender e estudar. O termo aprender deriva do latim apprehendere que significa literalmente capturar. Aprender exprime o gesto do gato que caça o rato, do policia que apreça o ladrão ou do aprendiz que se esforça por capturar um determinado saber. Na órbita de esta palavra encontramos expressões como apreensão, presa, ou empresa. A palavra estudo provem do latim estudium com o significado de empenho, aplicação, zelo, anseio, cuidado, desvelo, possuindo também o sentido de afeto (“studia habere alicuius” queria dizer “gozar do afeto de alguém”) Falar de estudar algo sem agrado, era para os latinos um contrassenso, ao ponto de que, para dizer que algo devia ser feito por mera obrigação, utilizava-se a expressão “non studio, sed offcio”, isto é  “não por agrado, mas por obrigação”. Existe então uma grande diferença entre aprender filosofia e estudar filosofia, entre aprender uma língua e estudar uma língua e esta diferença tem muito a nos dizer acerca da forma e o sentido de nossas atuais instituições escolares. O aprender coloca o acento no sujeito que aprende, suas inquietações, desejos e propósitos, enquanto o estudar o faz na matéria estudada.  Aprende-se uma língua para viajar, para empreender um negocio, para comunicar uma ideia; se estuda uma língua pelo encantamento que uma determinada coisa acorda em nós, independentemente de qualquer utilidade. Quem estuda uma língua pode fazê-lo durante anos sem jamais chegar a dominá-la, sem jamais poder utiliza-la. A palavra aprender expressa o desejo de tomar algo do mundo, enquanto o termo estudo assinala, sobre tudo, o desejo de se colocar em relação a algo, de cuidá-lo e prestar-lhe atenção. Nesse sentido, poder-se-ia dizer que o estudioso não se serve daquilo que estuda, mas que, pelo contrário, deixa sua vida nisso.

O estudo implica uma disposição ao mundo, um afeto e, nesse sentido possui também uma ressonância anímica. Poder-se-ia dizer, nos termos de Heidegger, que o estudo constitui uma stimmung particular, oi seja, um particular estado de ânimo, uma forma de disposição anímica. Por outra parte, a noção de estudo evoca uma dimensão material, dado que estudar significa insistir sobre o mundo a partir de uma técnica específica, isto resulta claro quando consideramos os estudos de cavalos de Leonardo Da Vinci ou os estudos musicais de Villa-Lobos, nestes casos aa expressão “estudo” nos da a ideia de exercícios preparatórios,  de uma pesquisa minuciosa das formas. Estudar implica então, repetir, copiar, memorizar, se exercitar em alguma disciplina em particular. Por último, a ideia de estudo nos remete ao arranjo de tempo, espaço e materialidade que permite e sustenta uma determinada atividade, isto é, ao estudo como lugar, no sentido em que usamos esta expressão quando falamos de um estúdio de cinema ou de um estúdio de arquitetura.

Se esta distinção entre aprender e estudar nos interessa, ao ponto de tomá-la como tema de um seminário internacional, é porque intuímos que nela está em jogo um modo particular de relação com o mundo, com o tempo e com os outros. Acreditamos que uma consideração paciente e minuciosa da ideia de estudo, suas formas, seus pressupostos, suas condições e sentidos, poderia revelar algo acerca de nossas atuais instituições educativas e permitir pensar sua natureza específica e o modo em que as habitamos cotidianamente.